Com 28 celas individuais, a instalação procura preservar o seu instinto natural para garantir a segurança e a conservação da espécie. Na costa oeste da Baía de Hudson, na província canadiana de Manitoba, fica Churchill, uma pequena cidade considerada a “Capital Mundial do Urso Polar”, pois todos os anos centenas desses predadores fazem uma parada obrigatória em suas migrações, tornando o local um ponto de observação natural único no mundo.
De acordo com o jornal britânico The Guardian, quando o verão derrete o gelo marinho, esses mamíferos são obrigados a permanecer em terra firme, esperando até novembro para que o gelo se forme novamente. Em outubro, vários deles já estão a vaguear pela zona, o que representa um desafio para a segurança da população local e dos próprios ursos.
No entanto, de acordo com a Polar Bears International, uma organização sem fins lucrativos dedicada à conservação desta espécie e do seu habitat, Churchill trabalha ativamente para estabelecer a primeira comunidade segura para ursos polares do planeta.
Historicamente, a população tem sido pioneira em métodos seguros de coexistência, apostando na eliminar de fontes de alimento que atraem os ursos, educando as pessoas sobre comportamentos seguros e mantendo a maior separação possível entre humanos e animais.
Além disso, entre outras iniciativas, destaca-se o Programa de Alerta de Ursos Polares, uma linha direta operacional 24 horas por dia durante todo o ano, onde os cidadãos têm a oportunidade de relatar avistamentos desses mamíferos que possam representar um risco iminente; uma vez identificados, o seu destino pode ser a prisão.
O que é o centro de retenção
Um dos pilares da estratégia de coexistência é a chamada Polar Bear Facility, conhecida coloquialmente como “a prisão dos ursos polares”. Este centro de detenção não é uma prisão convencional, mas uma instalação destinada a conter temporariamente e de forma humanitária os Ursus maritimus que se aventuram muito perto do núcleo urbano.
De acordo com a National Geographic, os animais chegam ao centro de duas maneiras: ou apanhados em grandes armadilhas com iscas ou sedados com dardos tranquilizantes se já estiverem dentro da cidade. No entanto, antes de recorrer a essas medidas, os guardas florestais ou “rangers” tentam afugentá-los com motocicletas, sinalizadores e tiros de advertência para evitar qualquer confronto que possa ser fatal tanto para os humanos quanto para os animais.
Uma vez dentro da instalação, os ursos permanecem presos por trinta dias, com acesso a água, mas sem comida. Esta medida, que pode parecer cruel à primeira vista, tem como objetivo impedir que eles associem os seres humanos à alimentação.
De acordo com a lógica de conservação, detalhada pela National Geographic, se um urso polar associa a presença do Homo sapiens à obtenção de comida, ele perde o seu instinto de caça e torna-se dependente e perigoso, o que eventualmente pode condená-lo à morte.
O centro, construído como um enorme hangar de blocos de betão, conta com 28 celas individuais, equipadas com portas de aço e estruturas reforçadas que impedem qualquer interação visual entre eles. A maioria permanece lá até que a baía congele e eles possam retornar ao seu habitat natural. A libertação, na verdade, tornou-se um evento que muitos residentes aguardam com entusiasmo.
“O que eles fizeram em primeiro lugar determinará quanto tempo permanecerão lá. Um urso que é uma captura acidental não ficará tanto tempo quanto um urso com histórico de danos à propriedade ou risco para as pessoas”, explicou Brett Wlock, oficial de recursos naturais da agência de Conservação e Gestão da Água de Manitoba e diretor do Programa de Alerta de Ursos Polares, em entrevista à The Wildlife Society.
Uma linha tênue entre “força e fragilidade”
Quando um urso é libertado, o animal sedado é colocado em plataformas metálicas, preso em redes especialmente projetadas para transporte aéreo e, em seguida, transportado de helicóptero para áreas remotas, longe de qualquer assentamento humano.
O fotógrafo Gerardo del Villar, colaborador da National Geographic, relatou a sua experiência ao chegar pela primeira vez a Churchill: «Cuidado, os ursos podem estar em qualquer lugar», avisaram-no ao descer do avião, uma frase que o acompanharia durante toda a sua viagem.
Posteriormente, depois de conhecer a prisão, Del Villar partilhou a sua impressão: «Primeiro, retiraram-no da instalação numa plataforma metálica; o animal dormia profundamente devido ao sedativo. Vários homens carregaram-no com cuidado, como se segurassem um tesouro frágil, e colocaram-no numa grande rede especialmente concebida para estes transportes. Minutos depois, um helicóptero desceu e, num movimento preciso, prendeu a rede.
«Ver o urso a subir lentamente, suspenso no ar, foi uma das imagens mais comoventes da minha vida: o predador mais temido do Ártico transformado numa sombra suspensa, majestoso e vulnerável ao mesmo tempo», concluiu.
Em Churchill, a convivência com estes animais é um ato de responsabilidade ambiental, por isso, embora o nome do recinto possa parecer impactante, a chamada «prisão dos ursos polares» é, na realidade, um esforço para garantir que estes gigantes do Ártico possam continuar a existir em liberdade, sem ver os humanos como uma ameaça ou uma fonte de alimento.