Essas empresas têm semelhanças: registram exportações vultosas, mas pagamentos mínimos em impostos; têm acionistas estrangeiros e escritórios falsos.
Uma investigação jornalística revelou que um grupo de empresas criadas entre 2020 e 2023, com endereços inexistentes e sem registos financeiros verificáveis, exportou do Equador mais de 500 milhões de dólares em ouro em menos de três anos, mas pagou apenas uma fração dos impostos correspondentes.
Trata-se de uma reportagem da série “Opacidade dourada: mecanismos sobre o tráfico de ouro latino-americano”, liderada pelo portal Convoca.pe do Peru, em parceria com meios de comunicação do Brasil, Colômbia, Venezuela e o site equatoriano Plan V.
Uma das empresas que chamam a atenção nesse esquema é a Soulmetals, criada em maio de 2022 em Machala, província de El Oro. Em apenas sete meses de 2023, exportou US$ 105,4 milhões em ouro, tornando-se a sexta maior exportadora do país, de acordo com registros da Agência de Regulação e Controle de Energia e Recursos Naturais Não Renováveis.
No entanto, a empresa não tem escritórios visíveis, página web nem redes sociais. Também não há registos da sua folha de pagamentos na Superintendência de Empresas, e apenas se conhecem os nomes dos seus fundadores: Mercedes de Jesús Severino e Daniel Jaramillo, uma jovem com apenas o ensino básico e um mecânico automóvel.
A Soulmetals foi registada com um capital de 110 000 dólares e pagou apenas 169 336 dólares em impostos, um valor muito abaixo do que pagam as empresas mineiras com décadas de operação.
Também se destaca que, três meses após a sua criação, 50% da Soulmetals foi adquirida pelo empresário indiano Jha Pawan Sachidanand. Após a sua entrada, a empresa recebeu, no início de 2023, uma transferência de US$ 1,1 milhão do First Abu Dhabi Bank, o maior banco dos Emirados Árabes Unidos.
Padrões que se repetem com mais empresas mineiras
A Soulmetals não é um caso isolado. A investigação jornalística identificou pelo menos dez empresas criadas entre 2020 e 2023 que exportaram ouro no valor de US$ 529,7 milhões.
Nove dessas empresas pagaram, no total, apenas US$ 445.838 em impostos, o que representa 0,08% do valor exportado.
Entre elas estão empresas como Orocomin, Ekam Minerals, Chris Zahav, Roha Ophir Minerals e Rocadorada, todas com características semelhantes: fundadores sem experiência em mineração, acionistas estrangeiros (principalmente da Índia, Suíça e Peru), capitais reduzidos e endereços impossíveis de localizar.
Em vários casos, ao procurar os endereços registrados, foram encontrados apenas terrenos baldios, casas sem numeração ou locais vazios.
Os números também não batem. No caso da Roha Ophir Minerals Rhom S. A., sabe-se que ela pagou apenas US$ 55 em imposto de renda, apesar de exportar mais de US$ 29 milhões em ouro.
Enquanto a Lundin Gold, uma empresa formal que exportou cerca de US$ 1 bilhão entre 2019 e 2023, pagou cerca de 9,3% de suas vendas em impostos.
A Organização dos Estados Americanos (OEA) já havia alertado num relatório de 2021 que as novas empresas no Equador constituem um ponto de entrada do ouro ilegal nos mercados legais, pois permitem ocultar a sua origem antes de enviá-lo para refinarias no exterior.