O processo converte plásticos de baixo valor em óleos e ceras líquidas, que podem ser reutilizados como lubrificantes, combustíveis ou até mesmo velas. Funciona mesmo com plásticos contaminados com PVC, um material tóxico que normalmente impede a reciclagem.
Reciclagem sem separação
Desde embalagens de iogurte até sacolas de supermercado, o contacto diário com plásticos descartáveis é inevitável. Grande parte desses produtos é feita de poliolefinas, uma família de plásticos que inclui o polietileno (PE) e o polipropileno (PP), e que representam mais de 60% do consumo global de plásticos. Apesar da sua omnipresença, menos de 10% desses resíduos são reciclados de forma eficaz, o que agrava a crise ambiental.
Neste contexto, uma equipa de cientistas da Universidade Northwestern desenvolveu um novo processo de reciclagem sem separação prévia, utilizando um catalisador de níquel de baixo custo que poderá transformar radicalmente a forma como gerimos os resíduos plásticos.
O que muda com este novo processo
A inovação reside num catalisador de níquel catiónico, concebido como uma estrutura de local único, capaz de quebrar as ligações carbono-carbono extremamente resistentes que caracterizam as poliolefinas. Esta tecnologia permite:
- Processar misturas de plásticos sem necessidade de os separar por tipo.
- Converter plásticos sólidos de baixo valor em óleos e ceras com aplicações industriais.
- Resistir à presença de contaminantes como o PVC, que tradicionalmente inviabiliza os processos de reciclagem.
Em testes realizados com resíduos que continham até 25% de PVC, o catalisador não só manteve o seu desempenho, como aumentou a sua eficiência. Esta descoberta abre a porta à reciclagem de materiais que, até agora, acabavam inevitavelmente em aterros ou incineradoras.
Além da reciclagem mecânica
A reciclagem tradicional de plásticos — trituração, lavagem, fusão — mal consegue recuperar materiais de baixa qualidade e depende de uma classificação manual ou automatizada intensiva em recursos. Qualquer contaminação (restos de comida, etiquetas, diferentes tipos de plástico) pode arruinar o processo. Por outro lado, os métodos termoquímicos atuais requerem temperaturas superiores a 600 °C e um elevado consumo de energia.
Em contraste, o catalisador da Northwestern funciona com uma eficiência 10 vezes maior, usando menos quantidade de catalisador, menos pressão de hidrogénio e temperaturas 100 °C mais baixas do que tecnologias comparáveis. Esta abordagem representa um equilíbrio entre desempenho técnico e viabilidade económica.
Casos reais e projeção
Embora a investigação esteja em fase laboratorial, a sua aplicabilidade industrial não está longe. A possibilidade de utilizar níquel, um metal abundante, em vez de paládio ou platina, torna-o escalável. Já existem iniciativas como a Eastman Chemical Company ou a Quantafuel que exploram processos de reciclagem química à escala industrial. Este novo catalisador poderia ser integrado nessas linhas de trabalho ou inspirar novos modelos de negócios circulares.
Além disso, o facto de o catalisador ser reutilizável através de um tratamento simples com alquilalumínio reduz ainda mais a sua pegada ambiental e económica.
Potencial
Esta tecnologia tem o potencial de fechar o ciclo de vida dos plásticos mais difíceis, transformando resíduos problemáticos em recursos valiosos. Algumas implicações importantes incluem:
- Redução massiva de plásticos em aterros, eliminando a necessidade de triagem prévia.
- Aproveitamento de resíduos atualmente considerados «não recicláveis», como embalagens multicamadas ou plásticos misturados.
- Diminuição do consumo de energia em comparação com os métodos térmicos atuais.
- Novas oportunidades para a economia circular, ao gerar subprodutos como lubrificantes ou ceras reutilizáveis.
- Alívio para os sistemas municipais de gestão de resíduos, especialmente em regiões sem infraestrutura avançada de reciclagem.
Se esta tecnologia for implementada em grande escala e combinada com regulamentações que incentivem a reciclagem química responsável, poderá marcar um antes e um depois na luta contra a poluição plástica. E o mais importante: permitiria à sociedade gerir melhor a sua relação com os materiais que utiliza diariamente, sem sobrecarregar os consumidores ou trabalhadores com tarefas impossíveis, como separar cada embalagem por tipo de polímero.