Investigadores identificaram espécies inéditas — com formas e cores surpreendentes — a mais de 3.000 metros de profundidade no oceano Pacífico
O mundo marinho das profundezas ainda esconde surpresas, e a recente descoberta de três novas espécies de peixes-caracol na costa da Califórnia prova isso com folga. Longe das imagens habituais de criaturas ameaçadoras que costumam povoar o imaginário coletivo sobre os ecossistemas abissais, os cientistas identificaram exemplares de aparência surpreendentemente simpática a milhares de metros abaixo da superfície do oceano Pacífico.
O estudo foi publicado no dia 27 de agosto na revista BioOne e descreve o Careproctus colliculi, apelidado de peixe-caracol protuberante, de cabeça redonda e cor rosa; o Careproctus yanceyi, conhecido como peixe-caracol escuro, de cabeça redonda e tom preto; e o Paraliparis em, denominado peixe-caracol liso, de cabeça longa e também de cor preta.
Mackenzie Gerringer, principal autora do estudo e bióloga da State University of New York College em Geneseo, destacou em diálogo com a IFLScience que “dois deles são peixes-caracol pretos capturados na mesma imersão pelo submersível Alvin”. A presença conjunta de espécies não descritas no mesmo local é significativa, segundo Gerringer: «O facto de duas espécies não descritas de peixes-caracol terem sido capturadas no mesmo local, na mesma imersão, numa das zonas de águas profundas mais bem estudadas do mundo, mostra o quanto ainda temos a aprender sobre o nosso planeta».
A descoberta também chama a atenção pelo aspecto incomum dos animais para seres desse ambiente. Gerringer, entrevistada pelo The New York Times, comentou sobre o peixe-caracol protuberante capturado: este exemplar de cor rosa chiclete é “bastante adorável”. Não só é relevante pelo seu design físico, mas também por simbolizar as formas inesperadas que a vida pode assumir em ambientes extremos do oceano.
Métodos e contexto da recolha dos espécimes
A investigação destas novas espécies envolveu a utilização de tecnologia de ponta em exploração marinha. Para recolher os espécimes do peixe-caracol escuro (C. yanceyi) e do peixe-caracol liso (P. em), a equipa recorreu ao submersível Alvin, conseguindo capturá-los a uma profundidade de 4100 metros na Estação M, um renomado observatório de investigação marinha situado a cerca de 200 quilómetros da costa central da Califórnia.
Este ponto é fundamental pelo tempo que vem sendo estudado, o que realça o espanto das descobertas. Simultaneamente, o peixe-caracol protuberante foi obtido por meio de um veículo operado remotamente (ROV) que desceu até 3.270 metros no Canyon de Monterey, também na costa californiana. A variedade de métodos ilustra o nível de sofisticação necessário para explorar e coletar espécimes vivos em áreas tão profundas e remotas, onde as condições extremas dificultam tanto o acesso humano quanto a manutenção da vida durante a extração.
Características biológicas e taxonómicas das espécies descritas
As três espécies recém-descritas pertencem à família Liparidae, conhecidas como peixes-caracol, característicos por habitar os ambientes marinhos mais profundos. Estes animais apresentam cabeças grandes, corpos com aparência gelatinosa e muitos deles têm uma ventosa no ventre que lhes facilita aderir tanto a rochas como ao fundo do mar, e até mesmo prender-se a outros animais.
A investigação indica que, das espécies descritas, apenas o peixe-caracol liso (P. em) não possui essa ventosa. A coloração dos peixes-caracol é variada e pode incluir tons de azul, rosa, branco e roxo; sobre eles, Johanna Weston, ecologista de águas profundas do Instituto Oceanográfico Woods Hole — alheia ao estudo — disse ao New York Times: “eles têm cores lindas” e “também têm um sorriso encantador”.
Do ponto de vista técnico, para diferenciar e documentar as espécies, os cientistas analisaram o ADN de cada indivíduo, bem como detalhes sobre o tamanho, a forma e o número de vértebras. Brett Woodworth, coautor do estudo e oceanógrafo do Centro Hidrográfico Conjunto, indicou que «as duas espécies recolhidas na Estação M são crípticas; as suas morfologias externas são semelhantes».
Ele acrescentou: “Por meio de ambas as formas de identificação, não só conseguimos distingui-las, mas também compará-las com espécies conhecidas para compreender melhor a evolução do peixe-caracol nas profundezas marinhas”. Os nomes científicos refletem detalhes dos habitats ou dedicatórias: C. yanceyi foi batizado em homenagem ao biólogo Paul Yancey, enquanto P. em se refere à Estação M e C. colliculi alude à aparência rugosa de sua pele.
Importância científica e contribuições do estudo para a compreensão dos habitats de águas profundas
A descoberta e a descrição dessas espécies destacam a noção de que o principal habitat da Terra — as profundezas oceânicas — continua sendo, em grande parte, um mistério. Isso não apenas evidencia que há muito a ser descoberto, mesmo em áreas bem estudadas, mas também contribui para revelar a biodiversidade e a adaptação da vida em condições extremas de pressão e escuridão.
Nas palavras do coautor Jeffrey Drazen, o trabalho de Paul Yancey “moldou fundamentalmente a nossa compreensão da adaptação dos animais de águas profundas à alta pressão”. Por fim, o estudo aprofunda o conhecimento sobre os habitats abissais e destaca a importância de utilizar técnicas avançadas para desvendar a complexidade dos ecossistemas marinhos, facilitando a compreensão da evolução e adaptabilidade das espécies neste ambiente único.